Veganismo . Macrobiótica . Alimentação sem Glúten . Vida Saudável

Ana Cristina Marques – Projecto Escola Vegana

Entrevistas / Agosto 14, 2019

ANA CRISTINA MARQUES é professora de artes visuais no ensino secundário, com várias publicações em Design Gráfico, Web Design e Vídeo. É Licenciada em Design de Comunicação, com Mestrado em Comunicação Educacional Multimédia e Doutoramento em Média-Arte Digital. É uma das fundadoras do PROJECTO ESCOLA VEGANA, juntamente com outras colegas de trabalho, que resultou em um livro de receitas veganas, o COZINHAR COMPAIXÃO.

MACROVIDAVEGAN – Qual foi o seu “Start” para o vegetarianismo? Qual o seu regime alimentar dentro do vegetarianismo?

ANA CRISTINA MARQUES – Houve, ao longo da minha vida, momentos em que tentei mudar para uma alimentação sem carne, mas as pedras que se colocavam no caminho tinham diversas origens: o hábito do paladar, as questões sociais e a família. O amor pelos animais brigava com o hábito e a tradição e deixei-me ficar nessa indecisão doentia durante tempo a mais. Quando mudei, foi radical. Em termos de alimentação, não como carne, nem peixe, nem lacticínios. Não compro artigos de pele, não uso produtos testados animais. É claro que é impossível afirmar que sou vegana a 100%, pois se adoecer, sei que os medicamentos que me receitam foram testados em animais e que alguns têm lactose; que os testes iniciais terão sido feitos em porcos ou outro qualquer animal; que o meu esforço não é igual ao dos outros, que são ainda tantos! Isto é, não posso ter a pretensão de dominar o que sai fora do meu controle mas esforço-me por lutar contra o padrão actual.

MVV – Como foi a adaptação da sua alimentação? E em relação à sua família?

ACM – A minha adaptação foi célere – quando percebi que todo o pedaço de carne que estava no prato era de um animal (é estranho que esta conexão não seja universal, não é?) nada mais me fez mudar de ideia. Em termos familiares continua a ser complexo porque ninguém segue o meu plano alimentar nem vive a minha luta. Isso faz com que, frequentemente, as minhas refeições sejam pouco nutritivas, principalmente se estamos em passeio e as refeições são feitas em restaurantes. Quando se sai dos centros urbanos, principalmente como Lisboa ou Porto, onde a oferta já é muito variada e de qualidade, e se deambula pelo interior, apercebe-se que há um caminho colossal a ser feito. É raro o restaurante que apresente a opção vegetariana no menu e há um desconhecimento enorme sobre o que come um vegano. Essas duas palavras devem até ser evitadas se quisermos evitar um rebolar de olhos (como quem diz, lá vem mais um com estas modernices) – há outros modos de pedir as mesmas coisas.

MVV – Quais os seus lugares vegetarianos favoritos?

ACM – Além da minha casa e da dos meus amigos, há ofertas que aprecio e que recomendo. Alguns, não sendo vegetarianos, têm propostas saborosas e esses lugares não podem ser descurados. Há que insistir junto desses restaurantes que já abriram a porta à redução da carne e do peixe, embora tantos não concebam cozinhar sem ovos ou natas. Há um lugar simples, onde a comida é excelente, a loja Biofrade, na Parede. A lista de sítios é, felizmente, cada vez mais vasta.

MVV – O que mudou na sua vida depois que se tornou vegetariano(a)?

ACM – Nada como nos sentirmos coerentes! Esse foi um dos aspectos mais importantes da mudança e aquele que me fez não vacilar em momento algum. Mudou ser mais aguerrida nas minhas convicções e ter encontrado, graças a essa mudança, pessoas que, como eu, lutam por todos os animais. De alguma timidez inicial no assumir a escolha, passei, graças aos amigos, a ser bastante transparente, a assumi-las de vez e a arrastar algumas pessoas.

MVV – Você trabalha com algo relacionado ao vegetarianismo? Se sim, fale-nos um pouco sobre o seu trabalho:

ACM – Tudo o que fazemos está abrangido pelo vegetarianismo, independentemente do que façamos para ganhar a vida. Em princípio o meu trabalho não estaria relacionado, mas a partir do momento em que queremos passar uma mensagem ao mundo e dar a conhecer a dimensão do sofrimento dos animais à mão do homem, todos os momentos, todas as ações passam a estar envolvidas nessa mensagem. Foi com esse objetivo que nos reunimos, eu e algumas colegas e amigas, para aliar o nosso trabalho ao veganismo. Uma vez que trabalhamos numa escola e podemos contribuir para formar seres humanos mais íntegros, respeitadores do ambiente e dos animais e mais cuidadosos com a sua saúde, deitámos mãos à obra e começámos a dar a provar a cozinha vegana.

MVV – O que você recomenda, em termos de informação, para quem está se iniciando no vegetarianismo, mas que já passou por aquela fase dos vídeos mais chocantes?

ACM – Tenho alguma dificuldade em perceber como se consegue continuar a consumir carne a partir desse momento do choque. Devemos dar graças à internet e à difusão das imagens que só a tecnologia permite, por ser um poderoso aliado dos animais. Durante anos, o homem foi burilando meios cruéis de torturar e matar sem que ninguém se apercebesse disso pois as coisas eram feitas longe das zonas residenciais, às escondidas. Repare-se na importância que tiveram os drones para mostrar a dimensão de algumas explorações agropecuárias e os rios de sangue junto aos matadouros…  Agora a vida está cada vez mais difícil para os torturadores, mas, como sabemos, estamos longe do mundo perfeito.

O conselho que dou a quem começar, é que peça ajuda a alguém; que leia, se informe, experimente. Fale, muito. Que não ceda aos primeiros dissabores, literalmente falando.

MVV – Leitura obrigatória:

ACM – Recomendo a revista Weggan, portuguesa, grátis, online. Porque a informação chega sob diversas formas, aconselho a audição de podcasts (coisa que pode fazer enquanto caminha ou arruma a casa) e as TedTalks da Melanie Joy (a minha primeira fonte de informação e influência) e os livros dela e de outros estudiosos destes temas. O youtube tem muitos autores que disponibilizam informação credível que ajudam no dia a dia pois partilham a sua própria experiência.

MVV – Uma mensagem que você queira deixar para quem ainda está se convencendo de que o futuro tem que ser vegan:

ACM – Querer é meio caminho andado para conseguir. O melhor conselho que posso dar é o de ter coragem, não hesitar, não olhar para trás nem contar o que está errado no passado. Todos fomos outros, errámos e um dia conseguimos mudar. Consciencializar-se de que pode fazer a diferença num mundo surdo, selectivo, racista e especista – cada um de nós é uma arma pelos animais e não podemos abandoná-los à sua cruel sorte. Essa é a força que temos de ter, sem hesitações.

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